quinta-feira, dezembro 20, 2007

FELIZ NATAL!!!

O Natal é uma canseira, uma despesa, uma trapalhada. Perder imenso tempo a fazer doces e decorações, gastar um dinheirão em presentes e jantares, suportar a confusão dos cartões de boas-festas e das refeições de família.

É assim desde o princípio. A canseira que não foi para a Senhora, grávida de mais de oito meses, fazer centenas de quilómetros até Belém! A despesa da viagem, do nascimento, da ida para o Egipto! A trapalhada do recenseamento, da falta de acolhimento, do estábulo! Para não falar na confusão das visitas dos pastores, dos magos e, pior, dos soldados de Herodes. Acima de tudo, canseira, despesa e trapalhada estão mesmo no centro do mistério supremo que nos leva ainda hoje a celebrar o Natal. Porque o Deus sublime quis vir através dos céus nascer como um bebé. Porque o Senhor do universo dissipou toda a sua glória, escondendo-a naquele estábulo. Porque Ele sabia que os homens não o reconheceriam e iriam desprezá-lo e tentar matá-lo, até conseguirem.

O Natal só existe porque o Verbo de Deus quis suportar uma enorme canseira, despesa e trapalhada pela nossa salvação. Por isso hoje, quando corremos, gastamos e sofremos por causa do Natal, ao menos lembremo-nos do que Ele e sua Mãe correram, gastaram sofreram. Por nós. Participar no Natal é amar o próximo, mudar de vida, entrar no amor. Mas se não o fizermos, mesmo que não o queiramos fazer, ao menos participamos no Natal repetindo a canseira, despesa e trapalhada que foi desde o princípio.

(João César das Neves)

Feliz Natal!

terça-feira, outubro 23, 2007

Achas fácil ir para o Céu?



Foi a partir deste pedido que Nossa Senhora fez à Irmã Lúcia, na Sua aparição em Tuy, que nasceu a devoção dos primeiros Sábados!

Condições necessárias para a Salvação:
Confissão
Comunhão (na Eucaristia de Sábado)
Recitação do Terço
Meditação durante 15 min...
...em reparação do Coração de Maria que está muito ofendido (pelas mesmas coisas que ofendem o teu coração!)

Vem Experimentar connosco esta ligação a Maria!
cada Primeiro Sábado do mês na igreja dos Clérigos às 18h (a começar já dia 3 Novembro)



sábado, setembro 15, 2007

Adorações...o regresso


ola!
um abraço em Cristo para todos os que por aqui passarem!
esperamos que todas as vossas empresas e afazeres, assim como o bom do descanso de verão tenham sido bons!
estamos aqui para dar boas noticias a todos.

Manter uma chama viva é difícil, mas sem combustível é uma utopia. Por isso, e para que possamos continuamente crescer para mais perto daquele abraço que nos espera, é com muita felicidade que aqui noticiamos o regresso das adorações das terceiras terças feiras de cada mês, no colégio da Escravas do Sagrado Coração de Jesus.

Melhor que esta noticia só mesmo o facto de a próxima terça feira, dia 18 de Setembro ser já um destes dias e de termos todos encontro marcado com aquele que nos Criou, cria e cuida!

um abraço de muita paz para todos!

sexta-feira, julho 06, 2007

Torna-te Esfera porque DEUS não é quadrado

Esta imagem pertence a Escher, grande matemático, mas podemos muito facilmente, graças à Fé que o Espirito alimenta em nós, ver mais do que um autoretrato de Escher.

De facto, se observarmos, estamos a contemplar o Deus que se olha no reflexo de uma esfera. E o reflexo do nosso Deus é o homem.

No reflexo de Deus...
Vemos livros, que podemos olhar como a sabedoria de Deus que tantas vezes nos espanta e que de nós faz veículos. Estes livros são também símbolo importância da Palavra, assim chamada viva, porque realmente dentro de cada um de nós está o poder de dar vida a coisas tão simples e pequenas como palavras.
Esta palavra de Deus, tournou-se realmente viva, mas só depois de semeada e acolhida, cuidada, pelo solo fertil que foi, é e será Maria - a Nossa Senhora. A Palavra de Deus, semeada em Maria, tornou-se assim real Palavra viva na pessoa de Jesus.

No reflexo de Deus...
Vemos também uma casa, porque Deus É a eterna casa, o Lar onde regressamos a cada instante. Em nós Deus tem um lar e dá-nos um lar também, uma casa. Esta casa, é a Igreja.

Nesta casa encontramos conforto, silencio e luz.
Temos luz natural que entra pela janela. Enquanto natural, essa luz é criação de Deus e não do homem. Isto lembra-nos, e deve continuamente lembrar-nos, da presença constante da criação divina na nossa vida, da nossa não suficiência, da nossa necessidade de voltar à luz original para podermos criar luz para alguém.

Nesta casa encontramos conforto.
Sofás onde todos nós podemos sentar e ficar sem pressa. A lição é a de ser lugar de conforto para os outros. Criarmos em nós sofás, suaves, para que todos possam em nós descansar. Sofás que envolvem quem nos procura, imitando a envolvência de Jesus para todos os que o procuraram.

Nesta casa vemos uma lareira. Lugar do fogo.
No reflexo de Deus, que somos nós, deve estar o lugar para o fogo, o lugar para o Espírito do fogo. Esse lugar é o coração. Lugar de compaixão, de amor, fraternidade. Mas este lugar é dado a cada um de nós na medida em que nos deixarmos arder no fogo do Espírito e da purificação, que apaga as nossas vontades e torna as de Deus mais urgentes.

Esta casa, reflexo de Deus é a Igreja. Nessa casa deve existir luz natural, que ligue a Igreja ao poder de criação de Deus; deve existir conforto, não de um sofá para o corpo mas sim para o Espírito, para que no silencio, no conforto do silencio, psssamos escutar melhor o Senhor daquela "casa", e nessa "casa" de Deus, lembrar Moisés e tirar as sandálias dos pés; deve existir o fogo, o fogo do Espírito, exímio condutor desta casa de Deus ao longo de tantos séculos.



Tornar-se Esfera porque DEUS não é quadrado, poderá levar-vos e descobrir um Deus sem cantos obscuros, claro e portador de Paz.
Confiantes de que Deus nos vê no Seu reflexo, partamos para mais uma semana, sendo esfera, para que cada um ao olhar-nos veja a parte do seu reflexo que é Deus.

(Todo este posto foi inspirado numa actividade do Movimento da Mensagem de Fátima, à qual não pude assistir mas mesmo assim reflectindo no seu título "Torna-te esfera porque Deus não é quadrado" aqui deixo este post para usufruto de alguém...)
Parabéns ao MMF e obrigado pela actividade!

PAX

quinta-feira, maio 24, 2007

Nova recomendação para ler...

Olá!
Aqui estamos, não para vos deixarmos as nossas pobres palavras, mas para vos aconselhar algo que deve ser o nosso livro de cabeceira. Jesus de Nazaré foi escrito pelo nosso Papa BentoXVI.
Achamos, que perder a oportunidade de olhar Jesus pelos olhos de alguém que o Espírito Santo nos deu como Pastor é perder caminho até ao próprio Rabonni.
Se somos todos uma Igreja, escutemos o nosso Papa, façamos das suas palavras mapa para chegarmos à fonte de Vida e depois leva-la aos outros.

Se como nós têm muitos amigos que se calhar não fazem a mínima ideia de quem foi Jesus, dêem uma olhadela no livro e recomendem-no!

Esperamos que todos estejam bem...
(encontrarão no final do blog um review que achamos muito interessante)

um abraço
Yaniel

pax

domingo, abril 08, 2007

Páscoa Feliz…Feliz passagem…passagem rumo à felicidade!

Mas o que desejamos quando desejamos uma Páscoa feliz? Poderá este nosso desejo ser igual ou sequer semelhante? Por certo que muitos de nós desejamos que as reuniões e encontros familiares que acontecem nestes dias sejam pacíficos e felizes mas é tudo o que queremos dizer ao dizer Páscoa Feliz? A vós desejamos tudo isso, mas muito mais!
Descreveria estes dias que vivemos, a assim chamada semana Santa e o tríodo Pascal, como uma música de Arvo Part. É lenta, cheia de sombras e recantos muito escuros, intensamente fria e desumana, mas intensa e surpreendentemente colorida pela voz do Homem. Assim vos queríamos falar da Páscoa hoje.
Celebra-se em toda a comunidade judaica a passagem (Páscoa) do povo pelo deserto, caminho único para passar da escravatura à liberdade. Na música de Arvo Part sente-se isto de uma maneira particularmente clara.
Nesta obra (Te Deum), podemos vislumbrar as feridas nos pés de quem caminhou no deserto, infinitamente inferiores às feridas daquele que caminhou num deserto de humanidade, rodeado de tantos mas tão só; o cansaço a falta de fôlego e o desespero que precede sempre a graça. O povo que atravessou o mar vermelho, onde ficaram encerrados os que o perseguiam, deve ter-se sentido um pouco livre. Sentiram-se livres mas rodeados pelo deserto. É um paradoxo, até podemos pensar que é erróneo: Livres face a um deserto!
No mesmo sentido também a paixão de Jesus tem uma suspensão na cruz, onde os seus inimigos o aprisionaram. Morreu na cruz, o seu sofrimento teve aí o seu termo sendo um pouco sinal de libertação, mas também paradoxalmente a sua cruz deve ser para cada um de nós um deserto. Para os que assistiram, aquela cruz era o único sinal de salvação, mas como acreditar numa cruz?! Como me sentir livre às portas de um deserto?!
É aqui que a música muda. A harmonia que muda de tonalidade, fere ao princípio, surpreende e assusta mas liberta o fôlego suspenso em cada um de nós perante a morte aparente daquele que se dizia Filho de Deus, atrevido que se quis igualar a Deus, nunca o querendo no entanto substituir ou sequer existir sem O Pai.
Fixaram Jesus numa cruz, é aí que o vemos, preso a um lugar. Mas a simplicidade de algumas palavras do Novo Testamento iluminam o lugar onde Jesus está agora e onde nos quer ensinar a ficar: “Aquele que procurais não está aqui (…) Ele vai adiante de vós a caminho da Galileia.” Da Cruz, do deserto, em alguma instância, Jesus está agora no caminho, e é para o caminho que Jesus nos manda!
Estar a caminho é não nos fixarmos nas nossas seguranças e partir para onde sentimos a paz que advém do cumprimento da vontade de Deus. Não para o caminho mais seguro muitas vezes, nem sequer para o mais desejado, mas para o caminho que nos faça sentir a brisa da paz, que todos nós tivemos já a graça de sentir, qualquer que seja o nosso credo ou não credo.
A vossa vida testemunha de certeza a paz que traz o cansaço de um dia onde sentimos ter feito o bem, seguindo a consciência e não a ciência. Maior alegria deve sentir o vosso coração, aqui na berma de uma estrada, seguindo a Salvação.

sexta-feira, março 30, 2007

Uma presença sempre embaraçante


Apresentar publicamente uma posição sobre um tema, qualquer que ela e ele sejam, é hoje totalmente tolerado. Do aquecimento global ao cancro da próstata, do neo-realismo à sexualidade juvenil, do TGV ao trânsito intestinal, a nossa sociedade desinibida participa empenhada em todos os debates. Há discussões, lutas e contradições, mas nunca constrangimentos, limites, bloqueios.

Excepto, claro, na religião. Num tempo livre e aberto que se orgulha de discutir tudo, essa é a única matéria delicada. Há um racismo contra a crença. Considerado tema pessoal (o único!) é escondido na intimidade de cada um. Há, mas não se pode ver. Devassamos a privacidade até na televisão mas, mesmo entre os crentes, um texto público sobre a Fé (como este) gera sempre embaraço. Para que servem as convicções, senão para manifestar? Fala- -se de tudo, menos do essencial.

Pior, evangelização e missionação são hoje proselitismo e intolerância. Propagandeiam-se frigoríficos, clubes, dietas, políticas, teorias, mas não a doutrina cristã. É comum, até em sacerdotes, disfarçar os elementos religiosos atrás de chavões. Não se fala de Deus e Cristo, Céu e Inferno, Igreja e hierarquia. Prefere-se fazer apostolado com Gandhi e a ONU, dar catequese com O Principezinho. Ser cristão, afinal, é só ser honesto, solidário e ajudar os pobres, como qualquer sindicato ou ONG.

Esta desconfiança latente contra a Igreja, típica da sociedade europeia, mostrou já ser resistente até a mudanças radicais. Há 50 anos os cristãos assumiram que tinham de mudar para o mundo novo. O Concílio Vaticano II quis voltar ao essencial da mensagem, dispondo-se a alterar na forma o que fosse preciso. O resultado foi a maior transformação organizacional que o mundo alguma vez viu. Mudou-se muito mais do que podia esperar um observador imparcial nos anos 1950. Liturgia, organização, métodos, práticas tudo foi passado pelo crivo da crítica e reformado com vigor. A liturgia abandonou o latim, o Papa percorreu o mundo, lançou-se o diálogo ecuménico e inter-religioso. Houve exageros e debates, abandonos e clivagens, mas hoje qualquer observador imparcial tem de admitir que a Igreja, mantendo o essencial, disponibilizou-se a transformar quase tudo o resto.

Será que os críticos abrandaram a severidade? Está o mundo mais atraído ou, até, mais imparcial face à Igreja?

A mudança foi preciosa, mas não facilitou a missão. Pelo contrário, a incompreensão, afastamento e hostilidade parecem ter aumentado. A recente publicação das conclusões do sínodo sobre a liturgia eucarística (Exortação Apostólica Sacramentum Caritatis), um dos temas mais reformados, mostrou-o bem. O documento segue na via da inovação, mas os jornais não perceberam e disseram banalidades piores que nunca. Que os envergonhariam em qualquer outro tema.

O problema não é de hoje. Ele foi recorrente nos dois mil anos de História. No Concílio Vaticano II como no de Trento ou de Niceia, na acção de Bento XVI como de São Bento, São Paulo, Santo Atanásio, São Francisco ou Santo Inácio, a Igreja teve sempre de reinventar nos meios para propor a mensagem de que é portadora. E nunca foi aceite pelo mundo. Mas manteve-se uma presença desafiante no mundo.

A dificuldade é identificar os movimentos proféticos, não de épocas passadas, mas do momento. Como os contemporâneos de São Bruno ou São Domingos, é difícil reconhecer aqueles que as gerações futuras celebrarão. Um caso concreto ajudar a compreender. Acaba de ser publicado entre nós o livro de Luigi Giussani O Caminho para a Verdade é Uma Experiência (Tenacitas, Coimbra, 2007). Trata-se de uma recolha dos textos seminais de um dos movimentos eclesiais mais dinâmicos da actualidade, a Fraternidade Comunhão e Libertação. O Papa recebeu essa organização no passado sábado e no próximo dia 30 Lisboa será visitada pelo responsável mundial do Movimento, padre Julián Carrón, sucessor directo de Giussani, que falará no cinema São Jorge.

Esta é a via actual. Mesmo antes do Concílio, os movimentos de Igreja multiplicaram-se, do Opus Dei aos Focolares, dos carismáticos à Legião de Maria. Como há séculos com monges e frades, é aqui que fervilha a novidade do Evangelho. O mundo continua embaraçado perante o dinamismo dos Apóstolos, mas isso nunca embaraça a Igreja de Jesus Cristo. Ela tem de anunciar a Boa Nova de forma adequada ao tempo, mas sem procurar agradar ao mundo. "Importa mais obedecer a Deus que aos homens" (Act 5, 29).

João César das Neves
Professor universitário

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

«Hão-de olhar para aquele que trespassaram»

MENSAGEM DE SUA SANTIDADE

O PAPA BENTO XVI
PARA A QUARESMA DE 2007

«Hão-de olhar para aquele
que trespassaram»
(Jo 19, 37)

Queridos irmãos e irmãs!

"Hão-de olhar para Aquele que trespassaram" (Jo 19, 37). Este é o tema bíblico que guia este ano a nossa reflexão quaresmal. A Quaresma é tempo propício para aprender a deter-se com Maria e João, o discípulo predilecto, ao lado d'Aquele que, na Cruz, cumpre pela humanidade inteira o sacrifício da sua vida (cf. Jo 19, 25). Portanto, dirijamos o nosso olhar com participação mais viva, neste tempo de penitência e de oração, para Cristo crucificado que, morrendo no Calvário, nos revelou plenamente o amor de Deus. Detive-me sobre o tema do amor na Encíclica Deus caritas est, pondo em realce as suas duas formas fundamentais: o agape e o eros.

O amor de Deus: agape e eros

A palavra agape, muitas vezes presente no Novo Testamento, indica o amor oblativo de quem procura exclusivamente o bem do próximo; a palavra eros denota, ao contrário, o amor de quem deseja possuir o que lhe falta e anseia pela união com o amado. O amor com o qual Deus nos circunda é sem dúvida agape. De facto, pode o homem dar a Deus algo de bom que Ele já não possua? Tudo o que a criatura humana é e possui é dom divino: é portanto a criatura que tem necessidade de Deus em tudo. Mas o amor de Deus é também eros. No Antigo Testamento o Criador do universo mostra para com o povo que escolheu uma predilecção que transcende qualquer motivação humana. O profeta Oseias expressa esta paixão divina com imagens audazes, como a do amor de um homem por uma mulher adúltera (cf. 3, 1-3); Ezequiel, por seu lado, falando do relacionamento de Deus com o povo de Israel, não receia utilizar uma linguagem fervorosa e apaixonada (cf. 16, 1-22). Estes textos bíblicos indicam que o eros faz parte do próprio coração de Deus: o Omnipotente aguarda o "sim" das suas criaturas como um jovem esposo o da sua esposa. Infelizmente desde as suas origens a humanidade, seduzida pelas mentiras do Maligno, fechou-se ao amor de Deus, na ilusão de uma impossível auto-suficiência (cf. Gn 3, 1-7). Fechando-se em si mesmo, Adão afastou-se daquela fonte de vida que é o próprio Deus, e tornou-se o primeiro daqueles "que, pelo temor da morte, estavam toda a vida sujeitos à escravidão" (Hb 2, 15). Deus, contudo, não se deu por vencido, aliás o "não" do homem foi como que o estímulo decisivo que o levou a manifestar o seu amor em toda a sua força redentora.

A Cruz revela a plenitude do amor de Deus

É no mistério da Cruz que se revela plenamente o poder irresistível da misericórdia do Pai celeste. Para reconquistar o amor da sua criatura, Ele aceitou pagar um preço elevadíssimo: o sangue do seu Filho Unigénito. A morte, que para o primeiro Adão era sinal extremo de solidão e de incapacidade, transformou-se assim no acto supremo de amor e de liberdade do novo Adão. Pode-se então afirmar, com São Máximo, o Confessor, que Cristo "morreu, se assim se pode dizer, divinamente, porque morreu livremente" (Ambigua, 91, 1956). Na Cruz manifesta-se o eros de Deus por nós. Eros é de facto como se expressa o Pseudo-Dionísio aquela "força que não permite que o amante permaneça em si mesmo, mas o estimula a unir-se ao amado" (De divinis nominibus, IV, 13: PG 3, 712). Qual "eros mais insensato" (N. Cabasilas, Vita in Cristo, 648) do que aquele que levou o Filho de Deus a unir-se a nós até ao ponto de sofrer como próprias as consequências dos nossos delitos?

"Aquele que trespassaram"

Queridos irmãos e irmãs, olhemos para Cristo trespassado na Cruz! É Ele a revelação mais perturbadora do amor de Deus, um amor em que eros e agape, longe de se contraporem, se iluminam reciprocamente. Na Cruz é o próprio Deus que mendiga o amor da sua criatura: Ele tem sede do amor de cada um de nós. O apóstolo Tomé reconheceu Jesus como "Senhor e Deus" quando colocou o dedo na ferida do seu lado. Não surpreende que, entre os santos, muitos tenham encontrado no Coração de Jesus a expressão mais comovedora deste mistério de amor. Poder-se-ia até dizer que a revelação do eros de Deus ao homem é, na realidade, a expressão suprema do seu agape. Na verdade, só o amor no qual se unem o dom gratuito de si e o desejo apaixonado de reciprocidade infunde um enlevo que torna leves os sacrifícios mais pesados. Jesus disse: "E Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a Mim" (Jo 12, 32). A resposta que o Senhor deseja ardentemente de nós é antes de tudo que acolhamos o seu amor e nos deixemos atrair por Ele. Mas aceitar o seu amor não é suficiente. É preciso corresponder a este amor e comprometer-se depois a transmiti-lo aos outros: Cristo "atrai-me para si" para se unir comigo, para que eu aprenda a amar os irmãos com o seu mesmo amor.

Sangue e água

"Hão-de olhar para Aquele que trespassaram". Olhemos com confiança para o lado trespassado de Jesus, do qual brotam "sangue e água" (Jo 19, 34)! Os Padres da Igreja consideraram estes elementos como símbolos dos sacramentos do Baptismo e da Eucaristia. Com a água do Baptismo, graças à acção do Espírito Santo, abre-se para nós a intimidade do amor trinitário. No caminho quaresmal, recordando o nosso Baptismo, somos exortados a sair de nós próprios e a abrir-nos, num abandono confiante, ao abraço misericordioso do Pai (cf. São João Crisóstomo, Catechesi, 3, 14 ss.). O sangue, símbolo do amor do Bom Pastor, flui em nós especialmente no mistério eucarístico: "A Eucaristia atrai-nos para o acto oblativo de Jesus... somos envolvidos na dinâmica da sua doação" (Enc. Deus caritas est, 13). Vivamos então a Quaresma como um tempo "eucarístico", no qual, acolhendo o amor de Jesus, aprendemos a difundi-lo à nossa volta com todos os gestos e palavras. Contemplar "Aquele que trespassaram" estimular-nos-á desta forma a abrir o coração aos outros reconhecendo as feridas provocadas à dignidade do ser humano; impulsionar-nos-á, sobretudo, a combater qualquer forma de desprezo da vida e de exploração da pessoa e a aliviar os dramas da solidão e do abandono de tantas pessoas. A Quaresma seja para cada cristão uma experiência renovada do amor de Deus que nos foi dado em Cristo, amor que todos os dias devemos, por nossa vez, "dar novamente" ao próximo, sobretudo a quem mais sofre e é necessitado. Só assim poderemos participar plenamente da alegria da Páscoa. Maria, a Mãe do Belo Amor, nos guie neste itinerário quaresmal, caminho de conversão autêntica ao amor de Cristo. Desejo a vós, queridos irmãos e irmãs, um caminho quaresmal proveitoso, enquanto com afecto envio a todos uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 21 de Novembro de 2006.

BENEDICTUS PP. XVI